Psicodrama - Modelo de intervenção terapêutico

Sessão de encerramento, com Pilar del Rio (Fundação José Saramago), moderada por João Teixeira de Sousa

O Psicodrama é um modelo de intervenção psicoterapêutico desenvolvido e reconhecido em Portugal há cerca de 40 anos, muito embora a sua história remonte ao final do século XIX e início do século XX, em Viena, Áustria.

O tempo de J.L. Moreno foi um tempo de divisão social, de pós guerra e luta entre Nações (não muito diferente daquilo com que somos confrontados hoje). “Basta olhar para um lado ou para o outro”, como nos diz Pilar del Rio (presidente da Fundação José Saramago), para percebermos que nos dois lados do campo existem lesados, mortes e vida. A vida de pessoas que não escolheram morrer, nem tão pouco estar nestes campos de batalha.

A Sociedade Portuguesa de Psicodrama, aquela que segue o Modelo Moreniano, recebe-nos num aquecimento que começa pela própria provocação que o tema traz este ano: Liberdade, Criação e Encontro. Estar em grupo, estar em psicodrama é trazer o encontro, mas é no potencial que têm as primeiras duas palavras que nos permitimos a integrar um mundo mais profundo que não é mais do que um espelho de nós próprios. E é tempo de mudar!

Nestes 3 dias de Congresso encontramos muitas cadeiras vazias (encontro), prontas para ocupar um pouco de quem somos no outro: amigo, colega, aluno, filho, pai… Saudámos e homenageámos o nosso “pai” psicodramático, Professor José Manuel Teixeira de Sousa, que nos acolheu com o seu abraço na sua Terra Natal - Baião - através da celebração de um livro onde outros agora o recordam pelos 40 anos de prática psicodramática em Portugal. No Congresso de psicodrama damos abraços que parecem colo, choramos e rimos em simultâneo, abraçamos a poesia e beleza que é escutar Kant, nomear Dante ou fazer-nos representar por Ludovico Ariosto (1474-1533) através da sua epopeia «Orlando Furioso» permitindo-nos, assim, a voar até à Lua e resgatar o(s) juízo(s) – por todos – perdido(s) (in Orlando Furioso - 1516 - Ludovico Ariosto).

Para este texto em particular será necessário acautelar pedidos de desculpa, pois as palavras que acompanham esta publicação não poderão pertencer-me na totalidade, antes serão fruto de uma co-construção grupal (qual termo Moreniano) onde eu vou buscar parte de quem sou no que os outros me dão. É uma espécie de devolução teorizada acerca do que é a terapia (individual, de casal, grupal…) psicodramática. Lamento, ainda, as fotos que parecem vazias de conteúdo e que ressoam à nossa mente (normalmente atolada em imagens que tentamos encher com pessoas, sorrisos e contextos) como não relacionais. Todavia, a arte do Psicodrama é a capacidade de olharmos para dentro, olharmos para nós mesmos e resgatar os pedaços que andam no mundo, escondidos em espaços virgens e pouco habitados. Este texto pretende ligar as primeiras quatro publicações deste Blog, dando sentido a um termo que acompanhou todas as postagens e que serviu de meta para o texto que hoje culmina com a explicação (possível) deste modelo interventivo, dinâmico e (ainda para muitos) desconhecido. Um texto que celebra a abertura do primeiro grupo terapêutico da Coramente, em fevereiro deste ano e que espera receber novo grupo já em novembro. A palavra que a todos une: RELAÇÃO.

A Falha é, ensina-nos Moreno, a hipótese do Homem se recriar, projetar, moldar, movimentar e construir em lugares que não sendo novos ganham contornos desconhecidos até então. Somos confrontados com os papéis que achamos já não serem nossos: aquele que não se leva a sério, aquele que sabendo da verdade que é sua, a subjaz à inevitabilidade do sítio onde pertencemos. Sim, é possível eu mudar… Mas eu, fruto de um Contexto, de um espaço a que Moreno chamou de Conserva Cultural por vezes não consigo mudar. Diz Pilar del Rio que «a falta de empatia na comunidade é permitida porque nos é cómoda». A seu tempo, tudo fica certo, ou talvez não, desafia-nos ela a pensar! Também nos são recordadas as palavras do próprio Saramago: “No mundo existem duas superpotências: uma são os Estados Unidos. A outra ÉS TU!”. Sem liberdade seríamos rebanhos, conclui. É sob este pretexto que - no psicodrama - as cadeiras se afastam (simbolizando um palco, um teatro que se abre à apresentação de algo a trabalhar) e se dramatiza ou se encenam situações que procuram reativa contextos que podem trazer desconforto em alguns momentos, mas que pretendem potenciar a melhora de papéis sociais, familiares, profissionais em cada um de nós. Assim, este é um momento muito importante no qual Moreno percebe que a elaboração pela ação é bastante eficaz (em tons que não sabemos se míticos ou reais, conta-se que se dirigiu a Freud dizendo “Você interpretou os sonhos dos seus pacientes. Eu faço os meus viverem os deles! Vou terminar o que você começou!”). O Psicodrama traz a palco a doença mental como fruto da impossibilidade de ser espontâneo, de ser liberto de preceitos que nos moldam de forma irregular e doente (nem tudo na vida é assim, não se preocupem). Moreno percebe através do teatro da espontaneidade a importância da experimentação como catalisador para “corrigir” dimensões de quem somos nos diferentes papéis que temos e que possam conter em si algum tipo de prejuízo para o próprio, seja enquanto mãe, pai, amigo ou filho, colega, professor, terapeuta ou qualquer outra área onde somos PESSOA. Arrisco-me a dizer outros (papéis) mais “mordazes” e auspiciosos: mentiroso, negligente, coercivo, melindroso, intrincado, audaz, misericordioso, companheiro, mulher, homem, fiel, infiel, complacente… Se eu tenho um "papel" da minha vida que está patologizado, que está doente, eu não o devo libertar, antes devo isolá-lo de forma a que não contagie os restantes. Pelo oposto, se eu tenho um papel “bom” na minha vida, que me traz alegria e bem estar devo expandi-lo até à sua máxima abertura, permitindo que este contamine outras áreas da minha vida. Assim “falho cada vez melhor!"  E é parte disto os ensinamentos que nos deixa este modelo que agora se reuniu em três dias de poderosas comunicações e felizes partilhas da Técnica.

Entramos na fase dos comentários: Eu, terapeuta, só posso ser (pessoa, terapeuta…) com a presença do outro. Sem ele eu nada sou! Quem nos diz é o próprio Teixeira de Sousa, enquanto nos apresenta o tempo das coisas: “Há momentos em que - se fazemos o trabalho bem feito - basta-nos ficar satisfeitos! Mesmo que os resultados desse trabalho só descubram os seus frutos à posteriori. A hipótese lançada a quem nos segue pelo Instagram é uma lembrança deste aspeto: é neste momento final de comentários (do grupo, dos egos auxiliares - uma vez que o modelo de psicodrama moreniano insiste na necessidade de trabalhar a par, esta intervenção acontece em co-terapia, com um ou mais auxiliares do Diretor - do próprio protagonizado e Diretor) que acontecem os grandes Insigths. Tal como noutros modelos de intervenção psicoterapêutica validados pela Ordem dos Psicólogos Portugueses (opp_perguntaserespostassobre_psicoterapia_v2.pdf) é através da “Eureka” que o paciente melhora, e está apto à mudança de comportamentos não saudáveis. No Psicodrama o funcionamento (este insigth, esta eureka) acontece pela devolução de comentários por parte de todo o grupo presente. 

E não é assustador? Perguntam os que são por nós deste lado desafiados a este modelo de intervenção.

É! Claro que sim! Procurar ajuda psicológica para terminar (ou diminuir) o nosso sofrimento exige um passo em frente, carregado de coragem e disponibilidade. É preciso reforçar que só podemos dar este passo com devida consciência e quando tivermos em nós essa força motriz! Não existem terapias possíveis se não estivermos disponíveis a esta relação! Pode ser de um para um, ou pode ser em grupo! Na Coramente, todas as metodologias de intervenção estão devidamente validadas pela Ordem dos Psicólogos Portugueses, sendo um psicodrama um destes métodos! 

Mais dúvidas, não hesitem em contactar-nos! Estaremos por cá: seja em modo grupal ou individual, trabalhamos com rigor e muito respeito para cada um de vós! E mesmo quando o caminho parece difuso, ou pouco claro, não desista! Tem consigo um Diretor, um Ego-Auxiliar e um grupo… EM RELAÇÃO, consigo

Drª Ângela Melo (Diretor) e Drª Rita Pinheiro (Egoauxiliar)

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